domingo, 20 de dezembro de 2009

levantei voo mas estou aterrissando
o calor de minhas asas já esfria
e não sinto mais os espamos ventrais
há inícios de brisas geladas correndo
pela pulsação sangüínea
deve ser a angústia da migração
mas prometi-me o hoje, que é ontem
o amanhã jurei a incógnite, que já é outro hoje
que seja, só uma semana mais
que já estou indo e você já vai
uma semana mais
para levantarmos voos turbulentos

Pássaros

I-Prólogo

Uma ave pousou em mim e me acariciou com suas plumas. Suas plumas eram flamas incandescentes que reluziam negras na escuridão. Tocando-as ou não, me queimaria. Portanto, toquei-as. Pegando-as, ou não, me arrependeria. Portanto, peguei-as. Ardi em febre por toda uma noite.
II-Desenvolvimento
O suor emergia de meus poros em uma profusão de flocos de sal e ferro. Sentia cada gotícula ser expelida de sua glândula e aflorar à superfície jorrando por minha pele.
III-Clímax
O pássaro da noite aninhou-se provisoriamente em minha cama e cobriu minha pelve, peitos e pernas com suas asas e o quarto incendiou-se invisível e a escuridão foi completa.
IV-Desfecho
A aurora se anunciava e a febre teria de ceder, antes de minhas enzimas tornarem-se debéis e meu cérebo perecesse. O pássaro de fogo era, pois, uma ave noturna e as luzes solares o transformariam numa criatura cinzenta e real, sem a sombra da noite para fazer luzir suas plumas, suas flamas. Levantou voo, seguindo os cânticos dissonantes migratórios.
V-Epílogo
Despertei, o suor seco grudado no corpo e os grãos de sal marinho dispostos em círculos. Ao abrir os olhos, deparei-me com uma pena branca com riscos cinzentos. Sorri e quase gargalhei em silêncio. Fiz a cama e por cima da pluma e dos lençóis joguei uma colcha para cobrir as lembranças e abafar sons de febre e pássaros